Olhos baços de esquecer
fixam um ponto no espaço da dor;
ou botam discurso ou gritam - num silêncio assustador
Alguns contam também os passos: traçam um círculo insatisfatório,
refazem-no hesitam no território, regressam depois
- metem o carro à frente dos bois,
saltam barreiras que ninguém vê
bebem fumam e outro lê
fechados em si muito urbanos
estão por aí: bem humanos.
Segunda
Por sobre a noite uma voz me preenche
e assim se dirige uma voz por sobre a noite
uma ausente luz desce, mexe e enche
o coração açoitado e onde o açoite (…)
Constelação Vega
E tinhas o brilho duma estrela gravado pelo peito
como se fosse uma tua tatuagem de luz
era um olho amarelo que te brilhava no peito
no sítio onde o esterno é metade
Isso era a sapiência do teu tórax todo feito luz
Era precisamente a sapiência dos teus pulmões
a explorarem fogo por fora do peito
e tinhas o brilho da constelação Vega
gravado pelo peito todo(…)
Nada mais - rien ne va plus
(…) Hoje é dormir cantar
dormir com uma canção na cabeça
dizer boa noite meu amor meus astros minha esfera
amanhã outra vez amanhã de novo te conheço
ressuscito para as coisas
e assim o sono a existência o momento que passa
e nada mais
porque nada mais meu bom Sartre na verdade
nada mais que o momento
conta senão para nós.
António Gancho (excertos de 3 dos seus poemas), in memoriam
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