quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

"Cantata"


SONETO

Rudes e breves as palavras pesam
mais do que as lajes ou a vida, tanto,
que levantar a torre do meu canto
é recriar o mundo pedra a pedra;
mina obscura e insondável, quis
acender-te o granito das estrelas
e nestes versos repetir com elas
o milagre das velhas pederneiras;
mas as pedras do fogo transformei-as
nas lousas cegas, áridas, da morte,
o dicionário que me coube em sorte
folheei-o ao rumor do sofrimento:
ó palavras de ferro, ainda sonho 
dar-vos a leve têmpera do vento.


Carlos de Oliveira (1921-1981)


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Dos olhos e suas funções


 Eu queria ter o tempo e o sossego suficientes
 Para não pensar em cousa nenhuma.
 Para nem me sentir viver,
 Para só saber de mim nos olhos dos outros, reflectido.


Alberto Caeiro/ Fernando Pessoa, (1888-1935)

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Baixa o tom

      Speak Low


Speak low when you speak, love
Our summer day withers away too soon, too soon
Speak low when you speak, love
Our moment is swift, like ships adrift, we're swept apart, too soon

Speak low, darling, speak low
Love is a spark, lost in the dark too soon, too soon
I feel wherever I go
That tomorrow is near, tomorrow is here and always too soon

Time is so old and love so brief
Love is pure gold and time a thief

We're late, darling, we're late
The curtain descends, everything ends too soon, too soon
I wait, darling, I wait
Will you speak low to me, speak love to me and soon

Time is so old and love so brief
Love is pure gold and time a thief

We're late, darling, we're late
The curtain descends, everything ends too soon, too soon
I wait, darling, I wait
Will you speak low to me, speak love to me and soon
Speak low


segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Luz iminente



 ANTES QUE a noite acabe
 Acende a luz da minha vida
 Com a tua chama, oh, meu Amor!
 Estou à espera da tarde
 Em que vens pelo caminho trazendo a tua chama,
 E o meu coração amadurecido nas suas trevas
 Acender-se-á como uma labareda.


Rabindranath Tagore, Índia (1861-1941)

      (trad de José Agostinho Baptista)


fotografia" intervencionada" de um trabalho de Helder Castro. 

sábado, 4 de fevereiro de 2017

Baladas: das águas- a de ontem- e do outono

Música: Armando Carlos da Silva Marta (1940-2007)
Letra: 1ª quadra de Fernanda de Castro, adaptada por Armando Carlos da Silva Marta;
2ª quadra de Armando Carlos da Silva Marta
Incipit: Ó rio das águas claras
Origem: Coimbra
Data: ca. 1960

Ó rio das águas claras
Que te vais lançar no mar!
Não leves minha alegria,
Leva antes meu penar.

Ó meu amor, minha vida,
Como vivo amargurado...
Só, numa ilha perdida,
E a saudade a meu lado.

Canta-se o 1.º dístico, repete-se; canta-se o 2.º e bisa-se.

Informação complementar:
Canção musical estrófica em compasso 4/4 e tom de Si Menor, gravada por 1962 e comercializada em 1963 pelo tenor Armando Marta.


sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Catherine Ribeiro


Uma Senhora Cantora
                                     que também foi actriz      e ainda é nossa prima.



Não tem feito ouvir a sua voz: dizem que se retirou...


quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

No jardim da guerra- a voz obstinada e frágil da papoila


«Je n’use que de ma voix si proche du silence et
 qui n’a que l’obstination fragile du coquelicot
 pour te mettre à la question
 il ne me faut que la tenaille des mots
 durcie au feu continu du chagrin
 mais par exemple je ne demande moi
 ni pourquoi ni comment
 ma question est ailleurs elle est bien avant le pourquoi
 et le comment
 je demande ce que c’est
 qu’est-ce que ce flux nerveux qui court des neurones
 à l’extrémité du bras
 et fait plier l’index sur la gâchette
 d’une arme automatique ?
 et qu’est-ce qui est automatique l’arme ou le geste ?
 qu’est-ce que cette émotion sèche qui gouverne la
 main meurtrière ?
 qu’est-ce que voit réellement l’œil qui vise ?
 qu’est-ce que le bruit des viscères qui se rompent
 dans l’oreille du tueur ?
 qu’est-ce que le relâchement de l’effort dans les
 muscles tendus pour tuer ?
 qu’est-ce que l’idée d’être là pour que l’autre n’y soit
 plus ?
 qu’est-ce que la certitude de devoir faire un mort ?
 qu’est-ce que le sentiment de la chose accomplie ?
 qu’est-ce que l’énergie surpuissante qu’il faut à
 l’index quand il enfonce
 le bouton qui fera le désastre ?
 qu’est-ce que ce geste du pied qui fait bouger la chose
 morte
 pour vérifier qu’elle est morte ?
 et qu’est-ce que ce coup gracieux dont on achève
 l’agonisant ?
 je sais mes questions
 c’est comme demander
 quelle est l’intention du gel qui tue le fruit
 du vent qui tue la branche
 du nœud de sable qui tue la source
 je sais mes questions
 n’ont pas de réponses
 et c’est pourquoi je les pose
 pour qu’enfin se taise le discours des effets et des
 causes »


Jean- Pierre Siméon, excerto de Stabat Mater Furiosa