quarta-feira, 22 de março de 2023

poesia e primavera adiadas- requentadas não!



Se não existissem poetas, o que seria de nós?

Em clamor ou em amor

feitas do mundo consciência

suas mãos irrequietas traduzem a nossa voz

com medida ou impudência

seus versos como uma pauta

suportam a estesia

onde o feio o não é

ou se é… é ironia

as palavras que mergulham em contextos fulgurantes

enchem o branco de imagens deixam o peito a arfar

dão a ver outras paragens onde queremos tardar

e mesmo naquelas paisagens que julgámos conhecer

o que estava atrás vem à frente

ganha vida o que não tem:

atalhos pedras raízes difíceis de vislumbrar

um anjo desasado que mesmo assim quer voar

flores sílaba a sílaba que o sopro torna vivazes

e os frutos...que prazer -

Senhores d’anestesia vosso reino está no chão

pra comer é a poesia melopeia e paixão

ethos no meio do nada corpo nas ondas nu

que o corpo moderno um fantasma

morreu dum ataque de asma envolto num pano cru. 



sábado, 18 de março de 2023

Navio vivo

 

… E desejar

   era maior que tudo

  - o mais vivo navio

   para a viagem

 

Ana Luísa Amaral




domingo, 5 de março de 2023

«Decepção à regra»

 

Decepção à regra

 

Sentar-me e

ver os outros passar é o

meu exercício favorito. Entretém.

Não esgota.

É gratuito. Neste meu jogo-do-não

são os outros que passam

(é aos outros que reservo a tarefa

de passar). Lavo daí os pés.

Escrevo de dentro da vida.

Pode até parecer que assim não

chego a lugar algum mas também quem

é que quer ir

ao sítio dos outros?

 

João Luís Barreto Guimarães, 1967