quinta-feira, 17 de março de 2016

« O Teatro»



(...) As palavras estão velhas, ridículas. Mercadoria estragada, restos que por esquecimento se não limparam. Repugnante. As palavras ficam no exterior da cidade, nas zonas de entulho. Às palavras, lançam-se-lhes pedras, aos loucos, escarra-se-lhes em cima. As palavras loucas seguem o seu caminho, sozinhas sem amor. Arrastam-se moribundas, vão para o hospital e pedem que as capem.
Cedem. As palavras aceitam o silêncio.
Mas eu estou em crer que dantes existiam as palavras vivas. Deve ter havido nalgum sítio uma guerra invisível que destruiu tudo, uma permanência prolongada num asilo, algum medicamento, uma guerra química na consciência. Esqueci. (...)


Emma Santos, França (1943- 1983)

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