quarta-feira, 27 de abril de 2022

«Facto/ Fado»

 

(...) É facil estar sempre alterando o jogo

 Variando o sentido das regras ad libitum

 ad hoc, ad gloriam, ad honores, ad nauseam

 ad verbum, ad litteram, sine ira et studio

 Pescando na excepção sempre outra coisa

 Dando ditos por não ditos, esquecendo o ter dito

 Com toda a simplicidade, sem má fé nenhuma

 Só porque viver é isto, uma salada de sucederes

 E a gente é pouco, a gente é assim mesmo, pequenos

 E estamos sózinhos habitando um saco de pele.

 

Mudamos vírgulas, corrigimos provas

 Passamos inquietos sobre as cristas volúveis

 De inquietos ditongos, alteramos as pautas

 Lavamos as mãos em sangue indelével...

Encerramos momentos-boda por garrafas gregárias

 E o nosso rasto é um eco pungente, fios de cheiro

 Talhando contornos à neblina, modelando fantasmas

 Que ficam para trás para que acreditemos

 Que viver não foi assim tão completamente inútil

E que ir vivendo não é nocivo, não é só irracional...

                                        (...)

                    João Pedro Grabato Dias

           (in Facto/Fado edição do autor, Porto, 1986)



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