segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

«Novíssimo Prometeu»- à data...



Novíssimo Prometeu

Eu quis acender o espírito da vida,
Quis refundir meu próprio molde,
Quis conhecer a verdade dos seres, dos elementos;
Me rebelei contra Deus,
Contra o papa, os banqueiros, a escola antiga,
Contra minha família, contra meu amor,
Depois contra o trabalho,
Depois contra a preguiça,
Depois contra mim mesmo,
Contra minhas três dimensões:

Então o ditador do mundo
Mandou me prender no Pão de Açúcar:
Vêm esquadrilhas de aviões
Bicar o meu pobre fígado.
Vomito bílis em quantidade,
Contemplo lá embaixo as filhas do mar
Vestidas de maiô, cantando sambas,
Vejo madrugadas e tardes nascerem
– Pureza e simplicidade da vida! –
Mas não posso pedir perdão.

Murilo Mendes, Brasil, Poesia completa e prosa
         (escrito entre 1932-35)

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