sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Poéticas extraterritoriais


Um marciano manda um postal para casa

Caxtons são pássaros mecânicos de muitas asas
 E alguns são muito apreciados pela coloração –

fazem os olhos derreter-se
 ou o corpo gemer de dor.

Nunca vi nenhum voar, mas
 às vezes pousam na mão.

 Névoa é quando o céu está cansado de voar
 e descansa no chão a máquina macia:

 então fica o mundo baço e livresco,
 como gravuras sob papel de seda.

A chuva é quando a terra é televisão.
 Tem a propriedade de tornar as cores mais escuras.

O Modelo T é um quarto com a fechadura dentro-
 dá-se a volta à chave e o mundo fica livre

 para o movimento, tão veloz que há um filme
 para ver tudo o que  passou despercebido.

Mas o tempo está atado ao pulso
 ou guardado numa caixa, fazendo um tiquetaque de impaciência.

Em lares, dorme um utensílio assombrado
 que ressona quando alguém lhe pega.

Se o fantasma chora, levam-no
 aos lábios e sossegam-no com sons

 até dormir de novo. E no entanto acordam-no
 de propósito, fazendo-lhe cócegas com um dedo.

Só às crianças se permite que sofram
em público. Os adultos vão para um quarto de castigo

 com água, mas sem nada de comer.
 Fecham a porta à chave e sofrem sozinhos

 os barulhos. Ninguém está dispensado,
 e a dor de cada um tem um cheiro diferente.

À noite, quando as cores todas morrem,
 escondem-se aos  pares

e lêem acerca de si próprios
 A cores, de pálpebras cerradas.

Craig Raine, Inglaterra, 1944

  (tradução de João Ferreira Duarte


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