sábado, 28 de fevereiro de 2015

«Sin título»










Sin Título
Me voy siendo:
Hilo jalado de una prenda
tejida por las manos cerosas del tiempo,
que en su giro de punto apretado,
va dibujando una línea de rizados cantos,
melodía que cambia
según me des-sea
sisa, manga, cuello o espalda
en las andadas en que:
Me estoy pensando:
Partícula sostenida por la tensión
de una materia poco clara,
más bien espesa,
más bien oscura y pesada,
suspendida en una boca sin lengua
porque aquí
todo es inefable.
Me transformo:
En pastizal al que le crecen yerbas
según los dedos de la tierra,
se junten y hagan relaciones
de presencia-ausencia.

Así,
mi vuelta de partícula en materia densa
descansa en el latido de una pequeña huerta
que cultiva la mujer salvaje,
florece cuando sus ojos de péndulo
entre la vida y la muerte,
tocan mi pupila despierta
y
Me voy inventando:
entre la otredad
que son yo misma
que soy la gente.

Joana Medellín Herrero, México, 1991

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Cantar



O CANTADOR

O cantador
chegou de madrugada
venceu a noite
pelas praias do mar
na sua voz
teceu uma balada 
amanhecer
que havemos de cantar

O cantador
rasgou as nossas penas
num canto moço
que havemos d'acender
na sua voz
ergueu vilas morenas
Maio maduro
que havemos de colher

Ergueu cidades
sem muros nem ameias
lançou sementes
na terra de ninguém
cantou o sol
rompeu nossas cadeias
trouxe consigo
outro amigo também

José Medeiros

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Festa



Festas


As necessidades superam os recursos
disponíveis. Boas notícias e más notícias:
 a Casa da Sorte está com muito movimento;
 algumas decisões são difíceis de tomar.


Jogos Santa Casa, cascos & rodados
 tomam posição sobre o mar largo. Dois homens
 conduzem a parelha de cavalos, capote alentejano,
 chapéu preto, suspensos como isco no anzol.


Ainda não é tarde para milagres: «viva as festas
 e aposte nos seus sonhos». Há talvez outra maneira
 de dizê-lo: as hipóteses de vencer são remotas
 e creio que o motivo somos nós.



Vítor Nogueira, Mar Largo

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Sono de Primavera




Sono de Primavera


Um chilrear de pássaros me chega ao ouvido
 Submerso ainda num sono de primavera
 Recordo a chuva e a ventania da noite passada
 Pergunto-me quantas flores teriam caído


 Mong Hao-Ran, China (689-740)

   (tradução de Jorge Sousa Braga)

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Shepperton


Shepperton

 no rio
 só peixes solitários
 só uma lua
 a que nunca se vê
 só barcos sem pessoas

 só água sem maré

Y K Centeno, Perto da terra







sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Coisas que não há que ... ah! ah!

Coisas que não há que há



Uma coisa que me põe triste
é que não exista o que não existe.
(Se é que não existe, e isto é que existe!)
Há tantas coisas bonitas que não há:
coisas que não há, gente que não há.
bichos que já houve e já não há,
livros por ler, coisas por ver,
feitos desfeitos, outros feitos por fazer,
pessoas tão boas ainda por nascer
e outras que
morreram há tanto tempo!
Tantas lembranças de que não me lembro,
sítios que não sei, invenções que não invento,
gente de vidro e de vento, países por achar,
paisagens, plantas, jardins de ar,
tudo o que eu nem posso imaginar
porque se o imaginasse já existia
embora num lugar onde só eu ia...

Manuel António Pina (1943-2012)



quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Para rir





Personae


Vivem em nós inúmeros; 
Se penso ou sinto, ignoro 
Quem é que pensa ou sente. 
Sou somente o lugar 
Onde se sente ou pensa.

Tenho mais almas que uma. 
Há mais eus do que eu mesmo. 
Existo todavia 
Indiferente a todos. 
Faço-os calar: eu falo.

Os impulsos cruzados 
Do que sinto ou não sinto 
Disputam em quem sou. 
Ignoro-os. Nada ditam 
A quem me sei: eu escrevo.


Ricardo Reis

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Sem sonhos

Quando deitarmos o último suspiro,
Colocarão tijolos na campa das nossas
cinzas
Das nossas cinzas moldarão tijolos
Para cobrir as campas daqueles que virão depois.


Omar Khayyãm, Pérsia (1048-1131)

(tradução de Halima Naimova)







Futuro no Presente: sonho


Pedra de Fecho

Sobre o presente escrevo. Raspo
a caliça do invólucro, tento
atingir o cerne emparedado.

Sobe até mim a esperança de supor
que serei ininteligível
aos leitores do futuro.

Penso que acreditarão mórbida
a minha "fantasia". Não poderão
entender este gosto de saliva
e veneno; esta floração
de artérias abertas sob a raiva.

Pensarão: "Que pavores o povoaram?
Como acreditar na falta de saúde
do tempo que descreve? Aceitaremos
este emissário da dor, este vazio
febril das mãos que estende?

Entre o papel e a luz escrevo
das moedas do agora. Pressagio
que não entenderão, que não serão
raros braços a arder os clarões na noite.

Egito Gonçalves, ( 8/4/1920-29/1/2001) 

                     Há sonhos que devem permanecer nas gavetas,
                      nos cofres, trancados até o nosso fim.
                      E por isso passíveis de serem sonhados a vida inteira.
                       Hilda Hilst, Brasil ( 21/04/1930- 4/02/2004)

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Desvantagens

The bark is not enough. It furls
Redundant shards, will barter
Rock for sap, blood for veering sluice,
While the leaf is pecked, brindled
With air, and how much more, furrowed
Or wrapped, between dog and wolf,
How much longer will it stake
The axe to its gloatin advantage?

Paul Auster, EUA, 3/02/1947


domingo, 15 de fevereiro de 2015

Ao namorado desconhecido

IN THE SEA CAVES

In the sea caves
there's a thirst there's a love
there's an ecstasy
all hard like shells
you can hold them in your palm.

In the sea caves
for whole days I gazed into your eyes
and I didn't know you nor did you know me.

 Giorgos Seferis, Grécia, (1900-1971)


                                                                 (tradução de Edmund Keeley and Philip Sherrard)

Desaparecer sem justa causa


Para ti

Para ti dispo-me até ficar com os nervos à mostra.
 Tiro as jóias e ponho-as na mesa de cabeceira,
 arranco as costelas, expando os pulmões numa sela.
 Dissolvo-me como um remédio em água, em vinho.
 Desaguo sem deixar rasto e parto sem revolver o ar.
 Faço-o por amor. Por amor, desapareço.


 Kim Addonizio, ( EUA, 1954),  Lucifer at the Starlite (2009)
                     (a tradução é minha)

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Pasmados, namoremos!






Nomes- próprios e outros

Yánis, Paula, Paulo, Fátima, Sereia, esboço, Quercus ilex rotundifolia, Zea Mays, Oaxaca, poácea, broca, vespinhas parasitas e joaninhas versus Monsanto, miúdos, zagais e, para o dia de hoje, uma molécula: a NGF.


quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Com fissão


 La última confesión de Monseñor Romero

Simplemente mantengo una posición de que no estoy confrontándome con nadie, sino que estoy tratando de servir al pueblo. Y el que esté en conflictos con el pueblo sí estará en conflictos conmigo. Pero mi amor es el pueblo; y desde el pueblo pueden ver, a la luz de la fe y del mandato que Dios me ha dado de conducir a este pueblo por los caminos del Evangelio, quiénes están conmigo y quiénes no están conmigo, viendo simplemente las relaciones con el pueblo (Homilía 20 de agosto de 1978)

Monseñor Romero


Hermano, confieso que he pecado:
Liberé a mi pueblo de los atroces invasores,
me solidaricé con el pobre con el mordido pobre,
fui pastor de los desprotegidos,
voz de los sin vos;
Señor, he pecado y mal utilizado vuestro nombre,
le di la razón a los indefensos,
me turné contra los que pagaron diezmo, vuestro diezmo,
contra los que te erigieron esta catedral
donde ahora confieso que te he abandonado,
Señor mío,
puesto que no puedo abandonar a los pobres
que rezan vuestro nombre
no puedo abandonar aquellos que viven
en vuestra fe para vuestra fe,
que rezan a vuestro hijo crucificado.

Ellos Señor, como bien vos lo sabéis,
no irán jamás al cielo
porque nadie jamás ha subido
del infierno a vuestro Reino.

Por eso te abandono y renuncio a ese Reino,
y el día que mañana mandés a mi verdugo
asegurate
que sea antes de comer vuestro cuerpo
para que pueda morir limpio,
impío de toda blasfemia e hipocresía
y condena con vuestro Reino a mi ejecutor
porque será él quien me dé voz
entre tus demás hijos capitalistas
que han vencido bajo tu nombre toda dignidad humana.

Por último te pido por mi pueblo
por mi pulgarcito, por mi San Salvador,
por mi Centroamérica,
por todos ellos te ruego y pido
para que algún día conozcan vuestro verdadero rostro
desvelado bajo las ráfagas de metralla,
bajo las masacres,
bajo los miles de cuerpos que abonan los campos
donde se erigen tus iglesias,
Señor, líbranos de todo mal.
Confieso que he pecado.

Inédito de A Cienfuegos (San Salvador, 1982)

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Séferis

Para a poesia não existem nem grandes nem pequenos países. O seu domínio é no coração de todos os homens.

CALLIGRAPHY

Sails on the Nile,
songless birds with one wing
searching silently for the other;
groping in the sky's absence
for the body of a marble youth;
inscribing on the blue with invisible ink
a desperate cry.


 ( tradução: Edmund Keeley e Philip Sherrard )

Just a little more

Just a little more
And we shall see the almond trees in blossom
The marbles shining in the sun
The sea, the curling waves.
Just a little more
Let us rise just a little higher.

( tradução de Rex Warner )

Giórgos Séferis, Grécia (1900-1971)


quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Viajar...

Viagem ao Egipto (excertos)

Na hesitante vibração dessa noite de inverno, o pedestal do obelisco fora encoberto por hieróglifos de incerta proveniência; em vão a pirâmide procuraria o sol, ou a curiosidade de viandantes e circunstantes um Champollion capaz de decifrá-los.

 Perto da menina Vitória que segurava na mão uma coroa de louros, falando distraidamente com Carlos e já virados a norte, notei que vos encontráveis. Mais a sul, fugindo de  ajuntamentos, estava eu, almejando acercar-me da Liberdade e saborear  igualmente a minha independência- sem grande alarido.(...)
















quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Vêem melhor- a qualquer hora

Vêm agora
 
Empoleirados em camiões.
O único contacto
Com a terra
É quando saltam
Para a pisar.
 
Têm um coração
Que deve ser cego,
Por isso amparam-se
A uma espingarda,
Como os cegos
A uma bengala.
 
Caminham dos pés à cabeça
Carregando com a morte:
São muitos
Os que tropeçam já
Num sulco de terra.
 
Esses
Não tornarão a ver
O disco da aurora.
Outros se seguirão,
Um a um.
 
Esta
É a palavra
 
Dum coração que vê.


Alberto Pimenta (26/12/1937)

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Correspondances
















Correspondances

La Nature est un temple où de vivants piliers
Laissent parfois sortir de confuses paroles;
L'homme y passe à travers des forêts de symboles
Qui l'observent avec des regards familiers.

Comme de longs échos qui de loin se confondent
Dans une ténébreuse et profonde unité,
Vaste comme la nuit et comme la clarté,
Les parfums, les couleurs et les sons se répondent.

II est des parfums frais comme des chairs d'enfants,
Doux comme les hautbois, verts comme les prairies,
— Et d'autres, corrompus, riches et triomphants,

Ayant l'expansion des choses infinies,
Comme l'ambre, le musc, le benjoin et l'encens,
Qui chantent les transports de l'esprit et des sens.


Charles Baudelaire, França, Les fleurs du mal