domingo, 31 de maio de 2015

«Eno alto...»

El camión de los muertos invisibles
cruza sin problema los controles
fronterizos                  se destraban las trabas
se aquieta el papeleo

El aroma muerto de los emigrantes muertos
en los bajos del camión no lo olfatean los perros entrenados
ni los detectan las cámaras
ni los escáneres lo leen

Desleído aroma
se ha vuelto simple aire

Sin darnos cuenta
los respiramos



      Daniel Bellón, Espanha (1963)




quarta-feira, 20 de maio de 2015

Sobre «a verdade»


What is truth?

What is truth? says Pilate,
Waits for no answer;
Double your stakes, says the clock
To the ageing dancer;
Double the guard, says Authority,
Treble the bars;
Holes in the sky, says the child
Scanning the stars.


Louis Macneice, Irlanda (1907-1963)





terça-feira, 19 de maio de 2015

A despropósito (ou talvez não...)


«...Quando refiro nas minhas aulas teorias erradas, perigosas e insultuosas da história da Ciência, que eram antes de aceitação quase unânime (incluindo questões de raça, género ou sexualidade), tento sempre evitar que os alunos se percam nas mensagens acessórias quase sempre subjacentes nos textos disponíveis (que tendem a contrastar um presente iluminado, com um passado feito de ignorâncias "óbvias") para os focar no essencial. Que é isto: nunca podemos usar o passado para exonerar o presente; a preocupação deve sempre ser identificar (e, se possível, corrigir) o que estamos a fazer hoje que daqui a vinte anos (ou menos) será visto unanimemente como nós vemos agora erros de outras gerações. Embora cortar esta espiral histórica de injustiça pareça muito difícil. Até quando terá a África do Sul democrática de usar o Apartheid como panaceia justificativa para o que não consegue resolver? Ou o Brasil o colonialismo (e/ou a ditadura)? Ou Israel o Holocausto? Sem escamotear o que quer que seja, estas continuam a ser realidades difíceis demasiado úteis e convenientes, também porque muitas vezes servem para dar respostas fáceis. O importante de "Papá em África" é pois não deixar circunscritos os demónios que evoca.»
Ler mais: http://visao.sapo.pt/apartheid=f807398#ixzz3abmllz32://visao.sapo.pt/apartheid=f807398







segunda-feira, 18 de maio de 2015

Falas- aventura dissonantes



Idiotas

De todas las idiotas
yo fui la única
que eligió sexo sin compromiso.
De todas las idiotas
yo fui la única
que bebió en los bares sola.
De todas las idiotas
preferí ser amiga con derechos
a novia con prejuicios.
De todas las idiotas
yo lo llamé
solo para ver si estaba bien.
De todas las idiotas
desprecié al hombre insulso
solamente para quedarme sola.
De todas las idiotas
soy la que cocina por amor a los aromas
y no a los hijos.
De todas las idiotas
soy la que no teme hablar
ni teme quedarse callada
cuando hay tiempos
en que las personas suelen ser
de escaso pensamiento.
De todas las idiotas
soy la que ama más a sus amigos
que a sus amantes.
De todas las idiotas
soy la que prefiere un hombre
con buena ortografía
que un buen trabajo.
De todas, todas las idiotas,
nunca pretendí destacarme,
nunca pretendí ser o no ser,
nunca pretendí molestar,
abusar, ignorar,
sin embargo, hasta los más idiotas
saben que mi poesía es mala,
que el alcohol es el puro elíxir
que solventa mis días de angustia,
Y cada que observo mi ventana,
el cigarro se disipa,
la cama está vacía
 y los poemas quietos;
y entonces siempre fui
la más idiota
de todas.

Mercedes Reynoso (México, 1990)

XXX

Entrar de navalha em
 punho
 enterrar no verbo os
 dois gumes
 bem fundo e certeiro
 corpo a corpo.
 Esperar que sangre
 a salvação carmim
 um verso de ponta e
 mola.

Marta Bernardes (1983), in  Claviculária


Tórax/ Heart


O último poema
    do último príncipe

Era capaz de atravessar a cidade em bicicleta só
 para te ver dançar.
 E isso
 diz muito sobre minha caixa torácica.


Matilde Campilho, 1982 in Jóquei

Heart 

She has painted her lips

hibiscus pink.
The upper lip dips
perfectly in the center

like a Valentine heart.
It makes sense to me—
that the lips, the open

ah of the mouth
is shaped more like a heart
than the actual human heart.
I remember the first time I saw it—

veined and shiny
as the ooze of a snail—
if this were what
we had been taught to draw

how differently we might have
learned to love.

Sally Bliumis-Dunn (EUA), Second Skin

domingo, 17 de maio de 2015

Palavras- aventura



Anticipación a los bárbaros

Y si han de decir, o tal vez ya han dicho soberbios,
que estos versos no tienen rima,
ni música, ni se esponjan con el verbo robusto;
si han dicho o piensan hacerlo
que carecen de ánimo y parecen
verborrea muerta,
sepan bien que les espera
el tenedor y el asa de estos podridos versos.
Que les espera el verbo que quema,
el verbo que saja las espaldas.
Sus exégesis sean epitafios.
Sus pies de nota, flores iracundas.
Mil palabras dirán y dirán nada.

Yo diré una y diré todas.

Juan David Torres Duarte

sábado, 16 de maio de 2015

Não sabemos, mas...



35.
Não sei
Se tornarei a ver
As caravanas
Que de madrugada
Atravessam o deserto
Em frente
Às ruínas de Palmira
Ou
As azenhas milenares
De Hama
A chiar de esforço
Quando elevam
A água do Oronte
Até ao aqueduto
Que encima a cidade
Ou
A paisagem
Aos pés do monte Kasyun
Coberta de estrelas
Que caíram
E se fizeram
Pura luz esparsa:
A cidade de Damasco
Não sei
Se tornarei
A fazer a viagem nocturna
No comboio de Bagdad:
Alepo, N´nive,
Tikrit…
E se outra vez ainda
Poderei erguer os olhos
E ver a beleza de Nahila
Nos limites da sua açoteia.

Já ouvi dentro de mim
Um trovão
Fender-me a alma.
Para a unir de novo
Não sei o que terei de enfrentar.

Marthiya de Abdel Hamid segundo Alberto Pimenta, 2005


«...para quem ama Bagdad é aqui perto.» Goethe




Comparación


No es lo mismo —no es igual— matar a una hormiga que
matar a seis millones de judíos.
Es lo mismo —en cambio— amar a un árbol que
amar a un hombre, la pierna carnosa de una mujer, su ritmo nocturno.
El amor es siempre el mismo:
traga de una fuente sola.

Sólo la maldad se deja ver en escalera.

Juan David Torres Duarte, Colômbia

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Lost in light




INSCRIÇÃO

Eu vi a luz em um país perdido.
A minha alma é lânguida e inerme.
Oh! Quem pudesse deslizar sem ruído!
No chão sumir-se, como faz um verme...

             Camilo Pessanha, (1867-1926)



      Fotocinesia

    Não fôra esta aragem,
    o Verão  instalaria o seu império de calor
    que invade a sombra e  afogueia os corpos.
    Porém, se do inverno desponta
    inesperada
   a claridade,
    a ela me exponho:
    para que me envolva e
    brandamente
    me penetre o âmago
    o osso.
   Fio-me na luz
   filamento fulgor farol
   agente da visão.


quinta-feira, 14 de maio de 2015

Tonalidades


La luz inútil

 qué extraña completud

ya sin relojes
ni calles cerradas

qué extraña completud el aire abierto

la sola luz
la luz inútil

al fin sin nudo ciego

para qué ver si nada que alumbrar
de este equilibrio hueco

ningún nombre
ningún árbol

ningún edificio torpe que vaya a derrumbarse

para qué el estupor suspendido
si no hay dónde caer

María Gómez Lara, Colômbia (1989)


Upload
a força da paisagem corrompe o texto,
penetra-o pela sua fragilidade.
o jogo do tacto, da fulguração, da tensão cénica
do teu nome -
que de tão tenso não é revelável -
mas posso sempre revelar-te esta fotografia, 
não como antigamente, mas
posso sempre entranhá-la no teu subconsciente através do feed do 
teu mural numa dessas redes sociais onde não há espaço a debate 
porque cada pessoa é o ditador da sua própria realidade, o que até é bastante
conveniente
se na vida pudéssemos ser confrontados exclusivamente com aquilo que não 
nos choca.
deixa-me rejubilar com a força de ver-te e com a força de saber que me vês,
sou assim uma imagem, sou matéria carnal, sou costas e ombros e pálpebras,
existo porque existe a luz.
deixa-me fazer o upload desta existência directamente na memória 
mais profunda
da tua libido.
talvez seja mais simples. o texto é coisa de poetas.


Sara F. Costa (1987)

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Portas e janelas










 Variaciones sobre la muerte

I.
Si es por la muerte, su peso es doble y ya no nos suelta.
No es por las puertas donde se asoma nuestro abandono.

José Lezama Lima


será por las ventanas
cuando quedan entreabiertas en la noche
la muerte se va acercando
no abandono sino brisa
tras los vidrios

los empuja
casi imperceptible
van cediendo

no hace falta quebrarlos
ellos mismos son la llave
sin puerta

mientras nosotros

esperamos

María Goméz Lara, Colômbia (1989)










segunda-feira, 11 de maio de 2015

Cozinha« gourmet»



Receita da cozinha mediterrânica gourmet

Arranje uma mulher, jovem q.b. e boa como o milho. Depois de cuidadosamente levada em conversa mais ou menos corrente,
 descasque-a ou pele-a, conforme o tempo de que dispuser.*
Lave-a de novo, agora num amplo recipiente ao qual juntou previamente dez gotas de Tendresse Olive Oil.
 Deite-a, inteira, a marinar no preparado,
 adicionando-lhe cem gramas  de carícias picantes  
e um ramo de salsos beijos. 
Não deixe repousar e acrescente logo dez gramas de mel. Prove. Rectifique os temperos. 
Em seguida, mexendo sempre com uma colher de pau, leve tudo a lume brando…
Agite-a o tempo que for necessário. Lume ao rubro, prato pronto.
Serve-se quente, com ou sem acompanhamento- quanto mais quente melhor!

*enquanto cozinha, sugere-se que utilize amiúde palavras da lírica tradicional.


( by Chef Gourmand)


domingo, 10 de maio de 2015

A escritora e a «crise» : conto



Conto


Era uma vez uma escritora tão poupada que 
não escrevia 
para não gastar papel e tinta.



Adília Lopes (1960)

Nota: a disposição gráfica que a autora deu ao seu conto não é esta.

sábado, 9 de maio de 2015

Somos...



São os rios

Somos o tempo. Somos a famosa
parábola de Heraclito, o Obscuro.
Somos a água, e não o diamante duro,
a que se perde, não a que repousa.
Somos o rio e somos aquele grego
que se olha no rio. A sua visagem
muda na água da mutável imagem,
no cristal que muda como o fogo.
Somos o vão rio determinado,
rumo ao seu mar; pela sombra cercado.
Tudo nos diz adeus, tudo se distancia.
A memória não cunha moeda.
E contudo há algo que se queda
e contudo há algo que se queixa.


Jorge Luís Borges, Argentina (1899-1986)