quinta-feira, 28 de abril de 2016

«Cidade da eterna primavera»

City of eternal spring

My mind rises up as the silos of interchanges,
streams, passages of myself in floating layers
so nothing can connect, and I dream emptiness
on ships sailing to new places for new names,
this ship my hands cupped in front of me,
a beggar’s bowl, a scooped out moon, a mouth
opened to make noiseless screams, to arrange,
to begin, to break through to stop my arrogance,
believing what I touch, see, feel, hear, taste make
a case for being alive, so I can stop believing what
happens when a caterpillar dreams itself beautiful.

What cannot be is suddenly what I was made
to believe can never be, fibers growing in illegal
spaces between layers of who I am and I wake
from nightmares that come at night or in the day,
memories of being betrayed gathering like iron
threads to make a prison where fibers of a miracle
of light crack open in a seed inside love to let me
dream a body inside this body with structures
that breathe and know one another so I rise
from thought to be being beyond thought
with energy as breath, a world with eyes
opening inside the light, inside knowing,
inside oneness that appears when the prison
frees me to know I am not it and it is not me.


Afaa Michael Weaver, EUA


terça-feira, 26 de abril de 2016

« O esfinge gorda»


(...) Não morrem jovens todos a que os Deuses amam, senão entendendo-se por morte o acabamento do que constitui a vida. E como à vida, além da mesma vida, a constitui o instinto natural com que se a vive, os Deuses, aos que amam, matam jovens ou na vida, ou no instinto natural com que vivê-la. Uns morrem; aos outros, tirado o instinto com que vivam, pesa a vida como morte, vivem morte, morrem a vida em ela. (...)


Fernando Pessoa, in Textos de crítica e de intervenção

sábado, 23 de abril de 2016

«Odisseus»


ULISSES

À praia de Ítaca
me trouxeram adormecido,
 um corpo inerte apenas.

 Primeiro
 não me reconheceram
 e depois nínguém me perguntou
 nada.

 Matei
 os pretendentes.
 E já

 não tenho de navegar.

Não tenho de inventar.
 Não tenho de inventar-me.
 Não tenho de ser
 outro.

 Não tenho de ser.

Nem sequer eu
 sonho com Odisseus.

 A minha fuga ao real
 cumpriu-se.


Zhivka Baltadzhieva, Bulgária (1947)

( a tradução, do inglês, é minha)

quarta-feira, 20 de abril de 2016

Um sonho frondoso



Un sueño frondoso

El sueño suele venir a cambiar las cosas,
 por eso me acuesto al lado de la mujer
 más hermosa de todas.
 La miro, ella no sabe de la naranja silenciosa,
 es mejor así, porque la mujer más hermosa
 merece los trinos, la luz,
el follaje entero de los árboles.
 si me duermo ¿estará ella mañana
con su bastón y su paciencia de tortuga?
Si me duermo ¿quién cuidará su sueño?
Quizás el sueño venga y cambie las cosas,
 como la muerte que a veces viene en forma
 de naranja silenciosa.
 Quizás el sueño venga como la muerte
 que también es otro sueño, vasto y frondoso
 que viene y se va y nunca avisa.


 Geraldine Mac Burney, Argentina (1984)

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Locutor: « una estatua del sonido»

GUIÓN
  
Locutor 1:
                 Música: Johan Sebastian Bach     La Pasión según San Mateo
trabajé en la radio               
Las madrugadas en las que el desierto buscaba a su presa
yo
trabajaba en la radio
en un cuarto/ piso


Locutor 2:

Trabajé en la radio
sólo el milagro era testigo
y yo era un reloj
una estatua del sonido.


Jair Cortés, México (1977), in História Solar


domingo, 17 de abril de 2016

Recordes ao sol



Recordes

 a preguiça, o piche
 o caracol do quintal,
 o cavalo marinho, a anémona
 e as unhas dos teus pés,
                   Desdémona
- prezam muito a lentidão...

o besouro-tigre a chita
o beija-flor Anna
 a luz
- pegam fogo com a pressa!

o agulhão-vela não
mas é também um campeão.


2 Musician Girls, Osman Hamdi Bey, 1880


quinta-feira, 14 de abril de 2016

Arrancar o coração


(...) Não é difícil abrir o peito a alguém. Pode exigir algum esforço físico dependendo da maneira que se escolhe para o fazer. No meu caso, que decidi fazê-lo com uma faca, precisei de alguma força de mãos e de braços.
Quando espetei a faca à procura do coração que sempre pensei estar a meio do peito, verifiquei que a carne ainda é mais mole do que parece. A faca entrou com tamanha facilidade que me pareceu estar a espetar um pedaço maior de pão. Claro que foi só até apanhar os ossos. Os ossos são muito difíceis ou talvez a faca não estivesse suficientemente afiada ou não fosse adequada. Mas abrir o peito a alguém não é difícil.
Difícil é tirar o coração a alguém.(...)Ainda que se consiga abrir o buraco no peito sem problemas o coração está escondido (...) o sangue também não ajuda (...) foi ela que me deu o coração, mas afinal não é assim tão fácil tirá-lo, ela devia saber que era difícil arrancar-lhe o coração(...)


Dulce Maria Cardoso, Campo de Sangue


sábado, 9 de abril de 2016

- Cinema e Modernidade


O coração está podre
 e quando o sangue nele
 entra, no campo ermo
 que ali deixou, ao recuar,
 o pensamento, fica branco
 até que em redor- a tempestade
 que as palavras até ali
 tinham trazido- tudo,
 sim, fique escurecido.
 É o sentimento, venoso?
 Flashes de vermelho e luz
 no fundo sensível da placa
 de veludo- crómio cerúleo,
 vulcões explodem nuvens
 merino, as cores, abocanhando
 (abrindo e fechando as bocas)-
 vistas daqui, afinal, crateras
 de uma superfície lunar
 que nos lembramos de,
 em Poe, ter percorrido.
 O universo morre ( ou
 renasce) em nós, novelo
 de um membro amputado
 onde alguém, uma entidade,
 aguarda que entrem em cena os personagens ( concreções
 livres de átomos) que por
 “desoeuvrement” ou “disperata
 vitalitá”, ali convergiram.
 Apagado o cigarro, a mulher
 vira-se de costas para a linguagem
 enquanto o veado, do outro lado
 da mesa, grita como se o ar,
 nos pulmões, o tivesse consumido. (...)

Fernando Guerreiro, (1950)

  ( excerto  de Cinema Eldorado )


quinta-feira, 7 de abril de 2016

«The Monster Heart»
















The Monster Heart

I want my heart to rush after other hearts
like a taxi trying to make a light.
Think of it:
the monster heart
the heart that ate New York,
a heart that solves arguments between lovers
by offering to love them both
if they promise to keep quiet,
a heart that. When interviewed on TV,
answers politely,
“No thank you, I only eat other hearts,”
and never mentions me personally-
a heart anyone could love,
if he didn’t already know
what was wrong with it



 Lauren Shakely EUA (1948)

terça-feira, 5 de abril de 2016

Lírios

O Pesquisador de luas

O crescente na fronte.

Lua, cicatriz da noite, gôndola de vidro
 onde voga meu romance- bronze sob a água...
 No coração da árvore, no búzio,
 o transporte certo de uma folha
 - balada na região d’esferas
  - reino exceptuado de alga e cinza...

Nuvens.

Um tépido clarim risca no vento
 subtis nostalgias, gentilezas, cores...
 Perfeitamente suspendo uma figura
 entre espelhos e estrelas...

Lírios.


Manuel de Castro (1934-1971)


segunda-feira, 4 de abril de 2016

Blue (s)

    Azul ultramar

 Me dijeron que tuviera fe,
que sería como Cristo caminando sobre las olas.

Cuando el cáncer llegó, lo vi en la superficie:
Dios teñido del azul de mar

y yo era el fondo,
la arena que resiente la ausencia de los pies.



Merari Lugo Ocaña (México, 1990)






sexta-feira, 1 de abril de 2016

Hmong


Light From a Burning Citadel


Once this highland was our birthplace. Once
we were children of kings.

Now I am a Siamese rosewood on fire.
I am a skin of sagging curtain.
I am a bone of bullet hole.
I am locked in the ash oven of a forest.

Peb yog and we will be.

The sky sleeps quilted in a militia of stars.

Someone has folded
gold and silver spirit
money into a thousand tiny boats.

Peb yog
hmoob and we will be.

I am hungry as the beggar who cracked
open a coconut to find
the heart of a wild gaur.

Hmoob and we
will be.

The tree is more ancient
than its homeland,
shedding its annual citrine
as hourglass dripping honey.

Peb yeej ib txwm yog
hmoob.

I dig and dig for no more roots to dig.
I soldier with my severed
legs, my fallen ear.

I’ve become the shrill
air in a bamboo pipe—the breath
of an army of bells.


Mai der Vang, EUA (1981)



Notas
                                                                                                                                                                                                                    1 Somos
2 Somos Hmong
3 Sempre temos sido/fomos Hmong.
 Os Hmong são uma etnia que habita principalmente em zonas montanhosas no Laos, Vietname,    Birmânia, Tailândia e na região montanhosa da China.