sábado, 9 de abril de 2016

- Cinema e Modernidade


O coração está podre
 e quando o sangue nele
 entra, no campo ermo
 que ali deixou, ao recuar,
 o pensamento, fica branco
 até que em redor- a tempestade
 que as palavras até ali
 tinham trazido- tudo,
 sim, fique escurecido.
 É o sentimento, venoso?
 Flashes de vermelho e luz
 no fundo sensível da placa
 de veludo- crómio cerúleo,
 vulcões explodem nuvens
 merino, as cores, abocanhando
 (abrindo e fechando as bocas)-
 vistas daqui, afinal, crateras
 de uma superfície lunar
 que nos lembramos de,
 em Poe, ter percorrido.
 O universo morre ( ou
 renasce) em nós, novelo
 de um membro amputado
 onde alguém, uma entidade,
 aguarda que entrem em cena os personagens ( concreções
 livres de átomos) que por
 “desoeuvrement” ou “disperata
 vitalitá”, ali convergiram.
 Apagado o cigarro, a mulher
 vira-se de costas para a linguagem
 enquanto o veado, do outro lado
 da mesa, grita como se o ar,
 nos pulmões, o tivesse consumido. (...)

Fernando Guerreiro, (1950)

  ( excerto  de Cinema Eldorado )


Sem comentários: