quarta-feira, 16 de março de 2022

«O monumento»

 

 Não se vê o seu rosto: ele olha para baixo,

Uma espingarda sobre os joelhos cerrados.

Não sente frio nem calor,

Não distingue a neve da chuva.

Não se vê o seu rosto: mas os vivos

Podem imaginar o que permanece escondido

E a sua cabeça inclinada

É a garantia de que ninguém o esculpiu.

 

Afeganistão, a segunda mundial:

Pena que não se comemorem a de Tróia,

A dos trinta anos, a do norte, a dos cem anos,

Não há um monumento comum a todas.

 

Vejo-me como um rosto,

Nada mais que um rosto de olhos fechados,

Um rosto: uma ilha no oceano,

Uma ilha no oceano do vazio,

Um rosto onde se nota o mais pequeno dos traços,

Orientado para o alto, como um hieróglifo,

Um hieróglifo gravado na pedra,

E ninguém para o ler.

 

Andréi Nitchenko, Rússia (1983)




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