sábado, 18 de janeiro de 2014

Cai,cai, cai- a bolsa do Ary





          Poeta castrado, não!

Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
cabeçudo dromedário
fogueira de exibição
teorema corolário
poema de mão em mão
lãzudo publicitário
malabarista cabrão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado      não!

Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é seu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também uma alegria
uma coragem serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena.

Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:

Da fome já se não fala
‑ é tão vulgar que nos cansa
mas que dizer de uma bala
num esqueleto de criança?

Do frio não reza a história
‑ a morte é branda e letal –
mas que dizer da memória
de uma bomba de napalm?
E o resto que pode ser
o poema dia a dia?
‑ Um bisturi a crescer
nas coxas de uma judia;
um filho que vai nascer
parido por asfixia?!
‑ Ah não me venham dizer
que é fonética a poesia!

Serei tudo o que disserem
por temor ou negação:
demagogo       mau profeta
falso médico       ladrão
prostituta       proxeneta
espoleta       televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!
    José Carlos Ary dos Santos

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